30 de jan. de 2012

Dez sorrisos


O homem ao lado sorri
Sem explicar o motivo
Talvez nem ele saiba...
Esses sorrisos automáticos que a gente veste
Para ver se a vida melhora
Ou pra ver se a gente ganha pelo menos
Outros sorrisos em paga
Ao que distribuímos de graça

Dou espaço para que sente
Uma mulher logo à direita
E o homem-sorriso da esquerda inclina-se perguntando pra que mês é
E a mulher diz que é uma menina
E que deve vir em Março
E já são dois sorrisos...

A moça de branco aparece, uma conhecida de escola
Da mulher
E com o cumprimento são três sorrisos
Quatro com o da mocinha que recebeu um elogio mal disfarçado
De um enfermeiro que ali passava
Cinco com o do enfermeiro
Seis com o do vendedor-menino que ofereceu picolé
Sete com o do homem que negou o picolé com uma piada idosa
Oito com o do médico, se desculpando pelo atraso
Nove com o do primeiro paciente da fila, aliviado

E quando eu já me perguntava
Por que raios eu era o único que parecia lembrar que aquilo ali
Era uma sala de espera de um consultório publico
Você apareceu e sentou-se à minha frente
E olhando-me, viu o décimo sorriso...

27 de Janeiro de 2012

28 de jan. de 2012

Mente despretensiosa



Despretensiosamente... Como quem anda numa rua vasta sem saber aonde vai. Quebra umas esquinas, adentra alguns becos, mas continua andando. O pior é não saber onde se vai chegar... Minto. O pior é não saber se saberá voltar... Mas voltar pra quê?

Segue a rua, segue os passos, o vento segue... Cegue...

Isto não é uma poesia, meu senhor. Isto não é uma poesia! Isto não é nada... Despretensiosamente, sem desejos e anseios, sem amores ou dores...

Afinal de contas, que é que é isso mesmo, senão uma autometáfora quase que absolutamente metonímica? Metonímica, metalinguística, metafórica, talvez um pouco hiperbólica, mas que importa? Importa que já não é absoluta... Absurda!

Despretensiosamente é que escrevo. E suponho que é assim que o leiam os poucos que aqui vieram perder seu tempo... A estrada é longa e íngreme. Tomem seus acentos...

Janeiro de 2012

18 de jan. de 2012

Mais um ano



Publicado no Jornal Independente


Acordou meio desorientado, tonto, cabeça doendo, ressaca braba... Mais um ano. Levantou-se, dirigiu-se ao banheiro do quarto e contemplou o conhecido rosto que aturava havia décadas. Mais um ano.

“O que você mudaria em si mesmo?”

Pergunta idiota de um quiz idiota que umas meninas idiotas inventaram de fazer na festa idiota da noite anterior, só pra passar o tempo, enquanto esperavam a meia noite. Mais da metade da turma já estava da bêbada, incluindo ele. Era isso que fazia todo fim de ano. Embebedava-se. Havia tempos não tinha ânimo para ver o ano passar. “Os anos é que me veem passando” troçava com os amigos.

Aceitava convite para qualquer festa. Dessa vez foi uma das sobrinhas da dona Chiquita, vizinha de reputação duvidosa, que lhe convidou. Festa da alta, muitas meninas bonitas e bebida liberada. Todas as ferramentas que ele precisava para virar o ano, fenômeno raro que se repetia a cada trezentos e sessenta e cinco dias.

“E você, gatão! O que mudaria em si mesmo? Todo mundo respondeu, só falta você.”

O que mudaria em si mesmo? Tudo, talvez. Mas advertiram que “tudo” não valia. Tinha que ser uma coisa só, específica. Talvez o nariz torto... Não, gostava do nariz torto, ninguém tinha um nariz daquele jeito e ele se sentia especial por isso. Os pés... Os olhos... Sim, gostava de olhos verdes e os deles eram pretos, mas não era motivo pra querer muda-los...

“Não dá, minhas lindas. Em mim ou é tudo ou nada.”

“Então defina tudo.”

E teve que dizer um “sei lá”... Sentiu-se humilhado. Não pelas meninas, nem pelos caras que assistiam quase rindo, mas por si mesmo. Percebeu que sabia muito pouco de si e que sequer se conhecia o bastante para querer mudar ou manter alguma coisa.

“Vamos para a próxima pergunta?”

Impacientou-se, pegou uma garrafa de vodka e foi sentar-se a um canto sozinho. Faltava pouco para meia-noite. Mal sentou ouviu os estouros dos fogos lá fora, os gritos cá dentro e sentiu os longos goles da bebida descendo... Mas a pergunta, o diabo da pergunta é que não descia... O que mudaria? Aliás, o que mudaria agora com a mudança de ano? Talvez nada, além dos calendários da parede...

Janeiro de 2012

5 de jan. de 2012

No Balanço desse Mar...





Sincero
O meu coração versa
A nossa primeira conversa.

I
Não sei o que havia 
Quando a via, 
Além da via.

II
Tua voz
- Esse concerto -
Me deixou em 
Desconserto.

III
Minha vida 
Amor, é nada 
Sem tua pele 
Amorenada...

IV
E riste, com quatro olhos
Os teus
E os meus
Nos teus

V
E calaram-se os motores 
Das pessoas 
E as vozes 
Dos carros

VI
Riste
O dedo em riste
Apontando minhas tolices

VII
No balanço desse mar
Conjugarei
O verbo amar

VIII
Deposto, 
És posto exposto
Ao posto.

IX
Em vão 
Busquei no vão 
O cheiro do seu perfume

X
Homessa! A promessa 
Que fizeste antes da partida 
Será um dia cumprida?


05 de Janeiro de 2011 (no Facebook)