20 de set. de 2009

Infância

Dona pixixica “mijou”* no canequinho
Enganou a pobrezinha
Que era caldo de galinha

É um dois três
É quatro, é cinco, é seis
É sete, é oito, é nove
Para doze faltam três

O castelo pegou fogo, São Francisco deu sinal
Acode, acode, acode a Bandeira Nacional!

Alô, Brasil!
Quem mexeu, saiu!
Na escola infantil só paga mil
Psiu!


*Era assim mesmo que cantávamos. Não sei quem ensinou... É uma brincadeira que fazíamos desde que me entendo por gente e que hoje pouco se vê. Fazíamos uma roda, quanto mais gente melhor; íamos cantando essa cantiga até chegar ao final – Brasil rimando com ‘saiu’ e ‘psiu’! Viu que chique! Aí todos congelavam a cena, quem mexesse primeiro saía da brincadeira. Tenho apenas vinte anos, mas na minha infância ainda havia tropas de resistência pelas brincadeiras antigas...

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Lá na rua vinte e quatro
A mulher matou um sapo
O culpado não fui eu
Foi aquele que mexeu*


*Mais uma brincadeira de estátua... Eu não sei por que a gente gostava tanto dessas coisas. Tinha uma que nem cantoria tinha. A gente simplesmente, no meio do cotidiano escolar, tivesse fazendo o que fizesse, gritava de repente: “Estátua!” e a pessoa tinha de paralisar. Para não ser pego por essa brincadeira, o cara tinha de estar de dedos cruzados. Aliás, neste gênero tinha várias outros jogos:

• Beijim Beijoca (beijim não é um trocadilho com a capital chinesa; é porque no sul da Bahia a gente tem uma forte influência do sotaque de minas – mistura danada) – como o próprio nome diz, quando gritasse essa expressão a pessoa tinha que dar um beijo em alguém, à escolha do que gritou;
• O vento levou – era simples, se o cara tivesse com qualquer coisa na mão e com os dedos descruzados, o vento levava...
• Meu e seu – era mais pra coisa de comer. Se estivesse comendo alguma coisa e alguém que estivesse na brincadeira gritasse: “Meu e seu!” a pessoa era obrigada a dividir com ele.
• Mão no bolso – essa era terrível! Se o cara fosse pego por alguém da brincadeira com as mãos fora do bolso era esmurrado nas costas até pô-las no bolso.

Obviamente essas não eram brincadeiras didáticas... Podiam também ser modificadas ao estilo de quem as fizesse. Por exemplo, “Mão no bolso”, muita gente firmava um acordo de “licença” no momento das aulas ou em outros momentos não propícios a levar murros nas costas – se é que haja algum momento propício pra isso. Para “O vento levou” o acordo é que não valeria objetos que poderiam comprometer o cabra em casa... Já pensou, você chegar em casa sem aquele caderno novo que sua mãe comprou? No Beijim Beijoca às vezes não valiam os meninos feios (sempre estive entre eles), às vezes acordava-se dar apenas selinhos ou beijos no rosto; às vezes era tudo liberado mesmo. Quem tá na chuva é pra se molhar. E ninguém mandou ficar de dedos descruzados... Essas brincadeiras funcionavam mesmo quase como contratos, só sendo quebrado se algum dos “sócios” falasse: “Parei”. Não havia assinaturas nem homologações, lógico. Tudo era acertado com um aperto de mão ou uma chave de mindinhos...


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Panelinha de breu
Foi no mar e encheu
Pocou, fedeu

Panelinha de carne frita
Quem ‘bufou’* foi Dona Rita


*Essas eram brincadeiras que acompanhavam àquele antigo costume de olhar pra ver quem estava com a mão amarela. Na impossibilidade de ver as mãos – porque todos, tendo peidado ou não, recusavam a mostrar as suas palmas – e na ausência de um cachorro pra pôr a culpa, eram ditas essas palavras a La uni-duni-tê. Quem fosse o sorteado na brincadeira levava a fama de peidão. Era muito eficaz para fugir da culpa, a não ser que o peidão fosse realmente revelado na brincadeira. Pelo menos nunca me pegaram...

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A vaca amarela cagou na janela, quem falar primeiro come a bosta dela*

*Por incrível que pareça essa não era uma brincadeira didática que os pais falavam: “vamos fazer essa molecada ficar calada! ‘A vaca amarela... ’” Na verdade brincávamos disso sem nenhum compromisso, quando não tínhamos nada pra fazer. Nessa eu quase sempre perdia, porque fui muito tagarela em casa, quando criança (hoje, quanta diferença!). Muitas vezes esquecia que estava no jogo e exclamava alguma surpresa, ou respondia a alguma pergunta de um adulto que não estava na brincadeira. Sempre eu. Aí era aquela algazarra, gritando: comeu bosta!!!.


A baratinha voou, voou, caiu na boca de fulano e pousou*

*Já essa é claramente didática. Tentávamos brincar com ela em casa, mas a da vaca amarela era muito melhor, mais livre e podíamos fazer a maior algazarra quando alguém falava, principalmente quando era sem querer. Nesta não; gritavam sutilmente: ‘Fulano comeu barata! Fulano comeu barata!’ Só dava pra ser feita na escola mesmo...

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Depois que a memória for refrescando, trago mais coisas da minha infância. Sei que são da infância de muita gente também. Outro dia conversava com uma amiga e dizia justamente isso, dessa minha memória associativa. Comecei a ouvir há poucas semanas algumas músicas relacionadas à minha infância, que me trouxeram à memória muitas das brincadeiras que fazíamos do jeitinho mesmo que fazíamos. Parecia que estava tudo ali, acontecendo na minha frente...

Lembrar minha infância me traz um sentimento tão grande de saudade, de desejo de voltar... Mas o tempo não volta... São as leis da dialética... tudo está em movimento...

Movimentemo-nos então...

Fernando Lago – 20 de Setembro de 2009 – às 02h05min

6 comentários:

  1. Muito bom :D Parabéns ^^

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  2. É saudade Fernando... e olha que brinquei minha infância até os 15 anos (rsrs)Uma das "mais vehas do grupo", ficava sobre com a responsabilidade liderar as brincadeiras, e desfazer desentendidos.
    Bom, as brincadeiras aqui trazidas por você fizeram parte de minha vida, e é sempre bom relembrá-las,seja através de convesas seja através da escrita, como o que foi postado por você.Mas infelizmente são brincadeiras que foram esquecidas, mas jamais substituídas, pois prefiro acretitar que o efeito que elas provocam, aparelho eletrônico algum será capaz de provocar.
    Bela postagem.

    Ps1. Minha brincadeira predileta era "boa de fôrno"

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  3. Eu tenho 17 anos e já sinto falta.
    rsrsrs... Era tudo tão simples, fácil. Apesar de sermos nós os complicadores de tudo... Podíamos nunca deixar de ser criança. =D
    Ótimo post! ;D

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  4. As brincadeiras eram tão legais que me recusava a crescer, brinquei até os 14 anos rsrsrsrsr (acho que sou criança até hoje.
    bom relembrar isso.
    abr. tody

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  5. aaaaaaaaaaah ;l

    esse post eh tão nostálgico...

    sou do sul da bahia ;P

    brinquei mto de tudo isso !!!

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Pode se jogar, mas não esqueça a sua bóia, viu?