3 de out. de 2011

Perdido



Eu pedalei, pedalei muito. E o que haveria de fazer em uma bicicleta além de pedalar? Pedalei e fui longe, muito longe. Ganas de fugir do mundo, de andar por lugares exóticos dessa cidade. Como não tinha, lugares desconhecidos me satisfaziam. Aquele, além de desconhecido, isolado.

De repente me senti perdido. Eu, um jovem tão conhecido e conhecedor, perdido na própria cidade! Procurei um letreiro, uma placa, qualquer coisa que me indicasse a localização, o ponto geográfico em que me encontrava naquele instante. Nada! Nem ninguém! Perdido e sozinho.

Uma pessoa vinha andando tranquilamente pelas ruas vazias, aspecto de cidade abandonada. Graças a Deus, eu encontrei ajuda! Ajuda? Por que não? Pela tez do sujeito não parecia nenhum psicopata, nem muito menos dava a aparência de estar perdido como eu... Devia conhecer bem o lugar, pela tranquilidade com que caminhava. Pálido, cara de americano. Ou europeu, sei lá, que das caras de caras como aquele cara eu não entendo, caramba! Só sei que devia ser estrangeiro. Ou filhote de um.

Xenofobia à parte, resolvi inquirir o sujeito de uma vez:

- Com licença, o senhor pode me ajudar?

O homem, que vinha caminhando com cara de paisagem, parou um pouco, com cara de cubismo, esticando as sobrancelhas como quem dissesse: “comequeé m’ermão?”

- O senhor sabe o nome dessa rua? Desse bairro?

­- What? I cannot understand you! ­

- Pronto!

Pronto! Mais essa agora! O sujeito não parecia um gringo; era um gringo. E, pior, um gringo que não falava português! Excelente hora pra eu testar o inglês da escolinha maia boca em que eu estudava, não?

- Excuse me, could you tell me where we are?

- What?

- This place, the name, localization…

- Of course, it’s New Jersey!

Nova Jersey! Quer dizer que tem um bairro com esse nome na cidade e eu nem sabia?

- I got to go to Vila Caraípe, or Caraípe Ville, do you know how I can do it?

- Sorry, I don’t…

- Caramba!

- Is this place here? I’ve never heard about it! And I live here since many years ago!

- Where you from?

- A city near to here…

- E por que você só fala inglês, porra?

- What? I don’t speak Spanish, please! Where are you from?

- It’s not Spanish, is Portuguese! And I’m from here, Brasil!

- Brazil! Are you crazy?

- Why?

- We’re in USA.

Morri de rir. O estranja devia ter amaluquecido de vez.

- You are crazy! This is Brasil!

Agora o cara que riu gostosamente, como se eu tivesse contado uma piada daquelas bem sujas que os homens gostamos. Me irritei.

- Quer dizer então que eu montei numa bicicleta, pedalei, pedalei, pedalei e vim parar nos EUA???

- What??? – disse o gringo mal contendo a risada – please, speak eglish, man!

- I just was in home, boring a lot. Tooke my bike and start cycling, with no road…

- And I was just walking in my favorite place, decided to make a detour and… Well, don’t care! We are in USA!

- Brasil!

- USA!!

- Brasil!!!

No meio da discussão, surge do nada um sujeito tranquilo, caminhando pelo outro lado da rua, usando um grande chapéu para tapar os raios quase inexistentes do sol. Creio que eu e o gringo tivemos a mesma ideia, porque ambos corremos desesperadamente em direção ao transeunte, assustando o coitado, com as perguntas feitas quase neuroticamente.

- Estamos no Brasil? – Perguntei

- We’re in USA? – perguntou o yankee

 - No señor – disse o sujeito – nosotros estamos en Mexico!


Fernando Lago – 2005. Revisado em 2011.

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Pode se jogar, mas não esqueça a sua bóia, viu?