Revelou naquele dia à
amiga que estava apaixonado por uma outra amiga. Sabia que a amiga em questão
apreciava sua companhia, mas daí a corresponder-lhe era esperar demais. A
confidente estranhou que ele estivesse tão pessimista, afinal de contas a amiga
do amigo – que era também sua amiga, nem era assim tão absurdamente bonita para
lhe pregar um "não" de maneira tão cruel. Mas, de qualquer forma, não sabia se
ele já tinha ouvido falar, mas corria as prosas por aí de que havia na cidade
um certo conselheiro que sabia dar pitaco na vida de todo mundo. Negócio direito,
testado e aprovado pelo primo do sobrinho do irmão da amiga da vizinha.
Mas o sujeito alegou
que não era dessas coisas, e que iria pegar muito mal se ele fosse ao tal
conselheiro, embora se sentisse verdadeiramente tentado a saber de uma opinião que
não fosse à do seu próprio coração burro. Amiga fiel, a confidente logo se
prontificou a ir ao famoso guru, contar a história tintim por tintim e arrancar
um conselho que o amigo pudesse utilizar. Não tendo condições de negar, o amigo
aceitou e aguardou o resultado.
Mal podia dormir de
dores imaginárias de paixão. Depois de tanto aguardar, veio a ligação da amiga repassando
ipsis litteris os dizeres do dotô:
“Como sua amiga está
sempre contigo e aprecia a tua companhia, te afastas dela por pelo menos uns
quinze dias, para ela sentir tua falta. Mas, atenção, nada de trapaças com o
destino: afastar-se é afastar-se, sem meios termos e sem dar-lhe explicações.
Ela, depois de muitas conclusões da própria cabeça, sentirá tua falta e há de
te procurar e só então verificarás se ela é realmente digna de que te reveles
apaixonado.”
O rapaz seguiu à risca
a sugestão do conselheiro. Mas, já no quinto dia, tudo se revelou vão. Pela
manhã, recebeu a notícia de que o objeto de seus sonhos platônicos tinha se
suicidado deixando um bilhete em que revelava o sentimento de que seu amado –
ele – se afastava e que se era assim, melhor era não viver. Consumatum est.
O que se seguiu foi uma
festa de choro e culpa, por mais que se tentasse convencer as partes do
contrário. O amigo achou que a culpa era dele, por ter seguido conselho tão
absurdo, ao invés de continuar na companhia de sua amiga-amada. A
amiga-confidente do amigo achou que a culpa era dela por ter sugerido, e mais,
ter ido, e mais, ter transmitido as interpelações do jovem ao conselheiro, e
mais, ter transmitido ao amigo as respostas do interpelado.
Quanto ao conselheiro,
tomava um café enquanto lia o seu jornal matinal, comentando as manchetes mais
interessantes:
- “Jovem suicida-se na
Vila Nova”. Veja só que coisa, Maria! Uma pessoa tão moça se suicidar assim!
Aposto que se tivesse se aconselhado comigo antes, a essa altura ainda estava
viva...
Fernando Lago – Fevereiro de 2012