22 de ago. de 2009

Autonomia além da pedagogia

Terminei ontem a leitura do livro Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire. A aquisição do exemplar deu-se, na verdade, há mais ou menos um ano, a propósito de um trabalho de Didática na Universidade. Não conclui a leitura do livro na ocasião, confesso. Li mal, mal a parte que era mais relevante para a realização do trabalho, que era, na verdade, uma oficina que “devia ser apresentada de maneira criativa”, como pediu a professora que orientava este componente curricular.

Remexendo a minha “biblioteca” recentemente, enxerguei o minúsculo exemplar piscando pra mim, entre os livros velhos de literatura que tenho. Parecia que aquele velhinho de barba branca estava me querendo dizer algo que não foi capitado pelos meus olhos de terceiro-semestrita, com os quais olhei-o no passado. Vamos ver, disse comigo, o que o “veim” vai dizer pra nós agora.

A leitura é ótima, recomendo para qualquer um. Fato interessante é que vi, nessa leitura de fato – pois a outra não pode ser considerada como tal – coisas que, antes mesmo de conhecer Paulo Freire, eu já defendia internamente e considerava como corretas. Então, basicamente, eu era progressista antes de ser progressista. Antes de ter entrado numa faculdade de Educação, já defendia as idéias deste educador, fora da educação. Daí o título do texto.

Quando Freire diz, por exemplo, que o novo “não pode ser negado ou acolhido só porque é novo” eu me lembro muito das minhas discussões com relação ás inovações tecnológicas e musicais no ramo da música. Nestes assuntos eu sou meio antiquado ou naturalista, como costumo dizer. Não gosto muito de fingimentos no palco. Gosto de música de verdade, com os acordes realmente tocados. Ao mesmo tempo, gosto de inovar, de criar, de resignificar as músicas. Só que sempre defendi que essa resignificação tem de ser feita de uma forma que os músicos consigam tocar. Ora, nem tudo o que é novo é revolucionário. Assim como também nem tudo o que é revolucionário tem de ser, necessariamente novo.

Assim, não estou acostumado com essas novidades sem acordes, sem notas, que se dança apenas, sem aquela musicalidade que nos faz “viajar e ir além”. Não é que não goste da tecnologia na música. Acho que ela ajuda muita gente. Inclusive minha Banda costuma usar sampler quando acompanhamos o cantor católico Léo Mantovani, em seus shows. Não tenho nenhum problema quanto a isso. Só defendo que o músico, ser autônomo, não tem que subir ao palco pra fingir que está tocando. Considero um desrespeito. Não apenas ao músico, mas também ao público. “O velho que preserva sua validade ou que encarna uma tradição ou marca uma presença no tempo continua novo.” É nessa frase de Freire que me baseio, ao defender a música natural, um violão no barzinho, um piano clássico a tocar Tom Jobim, uma moda de viola... Coisas do tipo.

Acabei alongando muito neste assunto. Mas não era só disso que iria falar. Não quis fazer uma relação entre Paulo Freire e minhas concepções musicais. Na verdade, o que eu queria dizer é que a Pedagogia da Autonomia vai além da educação. Os saberes apresentados por Freire nesta obra servem não apenas à autonomia do/a educando/a ou do/a educador/a. Servem á compreensão do ser humano como sujeito autônomo. Por isso, no meu entender, o livro não é recomendado apenas aos professores ou profissionais da educação, mas a todos, homens ou mulheres, que compreendem ou querem compreender a necessidade educativa do ser humano e a sua vocação à autonomia. “Seres programados, mas para aprender”, como diz François Jacob, citado por Freire neste livro.

Fernando Lago Santos – 22 de Agosto de 2009

4 comentários:

  1. Assim que acabar o NEI, Hamlet e ler uns dois livros aqui, irei pedir-lhe emprestado pois temo em fazer uma leitura como confessou ter feito no começo.
    Adorei o clima desta crônica, bem gostosa de ler, perfeita a citação que conclui o texto e suas palavras só me fazem a querer estudar mais para aprender mais... Inclusive esse será um tema do meu próximo texto no meu blog que será postado em inglÊs...Sim, tomei coragem e escrevi meu primeiro texto em inglês, para praticar. Sou estou esperando um colega meu corrigir para postar, aguardo sua visita lá.

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  2. "Autonomia além da Pedagogia"
    Sabe, é muito interessante quando nos identificamos com o pensar de alguém, ainda mais Paulo Freire.Onde você cita que já era progressista antes de ser progressista...
    Bacana a analogia que faz do livro com sua músicalidade, além de que o livro "Pedagogia da Autonomia" e diversos outros tantos devem ser lidos por todas as pessoas.
    No início deste ano inciei a leitura do mesmo livro citado, mas não cheguei a conclusão (ainda)Pretendo...Tive a oportunidade de ler, mesmo sem compromisso acadêmico, outro livro do Freire,"Pedagogia do oprimido", muito interessante também... se tiver um tempinho, o livro é muito bom.
    "Um beijo de Jesus pelos lábios de Maria"

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  3. Olá, Rosy!

    Li Pedagogia do Oprimido no início desse ano. Acho que todo pedagogo ou profissional da educação, ou pessoa interessada numa educação de qualidade e acessível a todos deve ler. Costumamos dizer que é a bíblia de todo pedagogo. Meu proximo passo é "Professora sim, tia não" e "Pedagogia da Esperança"
    Muito grato pela visita. Volte sempre.

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  4. Seu texto me fez lembrar que tenho uns 3 livros de Freire para concluir, na verdade devo recomeçar, Parabéns pela divulgação da obra desse mestre, tomara que a leitura de Freire vá para além da pedagogia...

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Pode se jogar, mas não esqueça a sua bóia, viu?